Os desafios para atingir a meta definida junto ao Ministério do Meio Ambiente vão das novas tecnologias de Sistemas de Aquecimento Solar – SAS até a qualificação da mão de obra e etiquetagem compulsória dos equipamentos
Durante dois dias – 09 e 10 de novembro -, especialistas em sistemas de aquecimento solar (SAS) reuniram-se em Campinas (SP) para apresentar as iniciativas em implantação e discutir novas ações para que o Brasil atinja a meta de 15 milhões de m² de coletores instalados até 2015, crescimento equivalente a 2,5 vezes a área atual de coletores, meta indicada no estudo “Plano de Ação Para Incentivo ao Uso de Aquecimento Solar de Água no Brasil” de 2007, coordenado pelo Ministério Minas Energia. Em meio às ações está a ampliação do SAS nas habitações de interesse social, a conscientização dos vários agentes da sociedade envolvidos, a Rede Procel Solar para qualificação de mão de obra, a formalização dos fornecedores e, também, a etiquetagem compulsória dos SAS produzidos no país, a ser implantada nos próximos meses, dentro do Programa Brasileiro de Etiquetagem – PBE do Inmetro.
Membros do governo, de universidades, empresários e profissionais do setor falaram a uma plateia de mais de 200 pessoas presentes no CB-SOL – Congresso Brasileiro de Aquecimento Solar realizado pela ABRAVA – Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento, através do seu Departamento Nacional de Aquecimento Solar (DASOL), com apoio da UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas. Convidados internacionais da Alemanha e Áustria colaboraram com os debates, relatando a experiência acumulada em outros países e as soluções e estratégias praticadas em outros mercados.
Na abertura do evento, Samoel Viera, presidente da ABRAVA, e José Ronaldo Kulb, presidente do Departamento Nacional de Aquecimento Solar da ABRAVA, justificaram os motivos que levaram a entidade a promover o evento, como representante dessa indústria nacional e a importância da preservação dos recursos naturais com o melhor aproveitamento das energias limpas, como a solar. O professor Gilberto Jannuzzi, da UNICAMP, destacou a importância do tema para o País, no momento em que o mundo inteiro repensa suas matrizes energéticas. Fez referência ao conteúdo programático proposto pela UNICAMP ao evento, com envolvimento de governo, universidade e indústria na discussão dos temas. A Eletrobrás, maior patrocinadora do evento, esteve representada no evento por Emerson Salvador, coordenador da Rede Procel Solar, que enfatizou as ações da empresa e o amplo apoio à tecnologia solar térmica.
Minha Casa…
Na primeira etapa do programa Minha Casa, Minha Vida a meta de 40 mil moradias com SAS foi ultrapassada, chegando a quase 42 mil. Agora, cresce a expectativa do setor diante da Portaria 325 do Ministério das Cidades, de julho de 2011, que determina o uso de aquecimento solar em boa parte das 1,2 milhão unidades habitacionais voltadas para a faixa 1, de renda de zero a três salários mínimos, a serem construídas até 2014. “Até o dia 07 de novembro passado, já tinham sido construídas 17.413 moradias da fase 2 do MCMV, sendo que 4.971 incorporaram coletores solares, o equivalente a 28% do total”, revelou Mara Luisa Alvim Motta, gerente executiva da Caixa Econômica Federal.
“O setor precisa levar adiante algumas ações fundamentais, a começar pela divulgação à população sobre as vantagens do sistema e sua simplicidade quanto ao uso e manutenção. A capacitação dos profissionais deve permear toda a cadeia, desde projetistas, arquitetos e engenheiros, até os instaladores. É importante, também, que se definam indicadores para medição e verificação de desempenho dos SAS”, recomendou Mara Motta que esclareceu, ainda, sobre as modalidades do Selo Casa Azul de impacto ambiental, da CAIXA.
A qualificação da mão de obra será amplamente equacionada pela recém lançada Rede Procel Solar – Rede Nacional de Cooperação em Energia Solar Térmica -, projeto da Eletrobras/Procel, para a criação de sete centros de capacitação no Brasil. A coordenação é da professora Elizabeth Marques Duarte Pereira, do Centro Universitário UNA-MG que, citando pesquisa da ABRAVA, afirmou que a meta de atingir 15 milhões de m² de coletores instalados até 2015, proposta no estudo do MME, promoverá 8,5 mil empregos diretos e a capacitação de 2,2 mil instaladores em cinco anos.
A professora que foi coordenadora do GreenSolar – laboratório de ensaios de SAS mantido pela PUC-Minas – desenvolveu há alguns anos uma pesquisa para a Eletrobras de medição e monitoração do uso de coletores em três regiões do país: centro-oeste, sudeste e sul. Foram aplicados 1400 questionários e feitas 700 visitas técnicas. “Observamos, por exemplo, que os moradores de baixa renda não fazem a limpeza das placas por desconhecimento do sistema. Quanto a instalação e manutenção do sistema de aquecimento solar, nem mesmo os bombeiros hidráulicos (encanadores) sabem plenamente o que fazer. Daí a necessidade de formação”, disse, acrescentando que esses moradores admitem a economia que o sistema proporciona, conta Elizabeth Pereira.
Casas x prédios
Sheyla Maria das Neves Damasceno, especialista em regulação da ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica – detalhou os avanços do Programa de Eficiência Energética das Empresas de Distribuição (PEE), desde sua criação há 11 anos. As 63 distribuidoras de energia concessionárias e as 30 permissionárias são obrigadas a destinar 1% de sua receita operacional líquida em ações que evitem o desperdício de energia, sendo 0,50% em pesquisa e desenvolvimento, e o restante em implantação efetiva de projetos, sendo alguns deles voltados para populações de baixa renda, como a implantação de sistemas de aquecimento solar em conjuntos habitacionais. A partir da resolução 300 de janeiro de 2008, já foram investidos R$ 100 milhões em projetos com SAS. Essa ação, no entanto, tem se destinado a moradias unifamiliares, de custo menor e implantação mais simples, se comparada a edifícios verticais.
A especialista ressaltou que novas regras poderão ser implantadas a partir de 2012 pela ANEEL. Entre elas, está a revisão de atendimento prioritário aos consumidores inscritos no Cadastro Único, com o respectivo Número de Inscrição Social (NIS). O argumento é de que é preciso que o programa amplie os benefícios da eficiência energética em outras classes sociais com o uso mais intenso de energia e, portanto, maior potencial de economia. Outra medida em estudo pela ANEEL é a flexibilidade para aplicação dos recursos do PEE, para que contemple novas edificações utilizando a experiência de projetos anteriores.
“A adoção dos SAS torna os sistemas prediais mais complexos, principalmente se aliados a outros recursos como reuso de água pluvial e de águas cinzas”, observou o professor Orestes Gonçalves, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Ao exigir a instalação de medidores individualizados nos edifícios, o sistema se torna mais caro e afugenta os construtores. “Daí”, sugeriu, “a necessidade maior aproximação entre universidade e fabricantes para a busca de soluções técnicas que viabilizem custos menores”.
A CDHU – Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – que universalizou em suas obras o uso de coletores solares, possui poucas implantações em edifícios verticais, conforme o arquiteto Eduardo Baldacci, Gestor do Programa de Eficiência Energética da empresa. “Os recursos da CDHU são destinados para moradias, sem distinção se serão construídos prédios ou casas. Temos subsídio para construir casas e para fazer prédios, mas precisamos que os recursos sejam diferenciados e que o setor fabricante colabore com soluções técnicas”, disse.
Eficiência energética
Segundo a professora Vanessa Gomes, da Unicamp, entre as cinco principais alternativas para que um edifício seja autosustentável em energia, a melhor é a que reúne sistema de aquecimento solar passivo e ativo, painéis fotovoltaicos, sombreamento e iluminação natural. “O SAS é considerado o segundo melhor retorno, ou seja, com menos recurso se obtém maior eficiência energética”, lembrou. Segundo ela, um dos maiores desafios enfrentados em todo o mundo para prover energia às cidades é o investimento: “a relação investimento x consumo é de 1 x 100”, informou, lembrando que entre 1960 até agora quintuplicou o número de tomadas numa residência para atender a necessidade dos eletroeletrônicos.
Para Carla Achão, representante da EPE – Empresa de Pesquisa Energética, os 2,5% dos domicílios com SAS para banho, dado histórico, precisa ser ampliado. Em 2005 eram 0,15 m²/habitante e, em 2010, esse valor mais do que dobrou, chegando a 0,33 m²/habitante, o que correspondendo a 6,2 mil domicílios. Para 2015, a previsão é de 12,2 mil domicílios com SAS em todo o Brasil, com benefícios na redução da demanda de eletricidade no horário de pico, além da economia de energia propriamente dita e decorrente impacto ambiental evitado.
“A etiqueta de eficiência energética brasileira – Procel Edifica – é a única no mundo que pontua separadamente o sistema de água quente do edifício, podendo ser a gás, solar, a óleo ou elétrica”, informou o professor Roberto Lamberts, da Universidade Federal de Santa Catarina. Ao revisar em conjunto com o INMETRO o RTQ-R – Regulamento Técnico da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de Edificações Residenciais -, Lamberts revelou ter constatado que a norma brasileira de aquecimento solar estava deficiente quanto ao dimensionamento dos sistemas. “Procuramos reforçar os métodos de dimensionamento, o que poderá servir de base na revisão da norma de solar”, disse, acrescentando que sempre será possível aprimorar a normativa.
Para Hamilton Moss, diretor do Departamento de Desenvolvimento Energético do MME, eficiência energética deve ser uma cultura incorporada ao cotidiano das empresas, da construção civil e da sociedade brasileira, e não aparecer apenas em tempos de crise de abastecimento. “O caminho ideal para que programas e ações sejam eficientes é a parceria entre os ministérios do Meio Ambiente e o de Minas e Energia”, afirmou, exemplificando com o Programa de Energia Eólica que atingirá 6 GW, em 2015, meta antecipada em 15 anos. Indicou aos presentes que o atual Plano Nacional de Eficiência Energética – PNEF apresenta um capítulo dedicado ao SAS e que o próximo passo será o desenvolvimento de planos de trabalhos.
Eficiência comprovada
Em 2010, a indústria brasileira produziu quase 1 milhão m² de sistemas de aquecimento solar, de acordo com Marcelo Mesquita, gestor do DASOL. “A previsão inicial era de se fechar o ano de 2011 com 7.477 milhões m² de coletores instalados, equivalente a um acréscimo de 20% sobre os atuais 6.238 milhões m². Entretanto a indústria sentiu uma queda no mercado no primeiro semestre de 2011, motivada principalmente pela transição do governo que descontinuou investimentos em vários setores. Porém, se mantida essa taxa anual de crescimento, especialmente diante da demanda do programa Minha Casa, Minha Vida, chegaremos a 15 milhões m² até 2015”. Essa é a expectativa do departamento da ABRAVA, segundo Mesquita. Ele lembrou que, em 2006, o país tinha apenas 434 mil m² de área de coletores.
“O sudeste puxa o mercado com 80% das vendas no primeiro semestre de 2011. No período, o segmento residencial continua à frente, respondendo pela aquisição de 59% de todo o mercado nacional de SAS, seguido pela indústria, comércio e serviços com 24%. As construções habitacionais já respondem por 18%”, revelou Marcelo Mesquita.
Marcos André Borges, coordenador do PBE – Programa Brasileiro de Etiquetagem, relatou que hoje estão etiquetados pelo INMETRO 216 modelos de 40 empresas fabricantes de sistemas de aquecimento solar, num total de 52 marcas. “Não há nada igual no mundo”, garantiu, dizendo que a etiqueta estimula a indústria a fabricar produtos com qualidade crescente, equilibrando a relação de consumo.
Carlos Arthur Alencar, VP Tecnologia e Meio Ambiente do DASOL/ABRAVA lembrou aspectos do novo Termo de Referência, destacando cuidados especiais ao setor para atendimento desse projeto e o posicionamento adequado quanto às responsabilidades assumidas no fornecimento. Alertou ainda para a necessidade de união da indústria em prol da qualidade de forma a valorizar os SAS no mercado brasileiro. “A organização setorial fortalecida deve ser permanente”, disse.
Integração na arquitetura
Na Alemanha, os SAS têm uso mais amplo, inclusive como matriz energética para os sistemas de ar condicionado. Segundo Jan Knaack, gerente de Projetos da Bundesverband Solarwirtschaft – associação do setor na Alemanha -, as residências detém a maior fatia do mercado de instalações de coletores para aquecimento de água. A aplicação térmica do solar se divide em 46% em residências; 23% no comércio; e 31% na indústria. “Temos, na Alemanha, uma longa experiência em energia solar e o Brasil pode buscar entre nós todo o conhecimento de que necessita para ampliar o seu mercado”, propôs Knaack.
O arquiteto Christian Holter, presidente da Solid – empresa austríaca fabricante de SAS -, contou que muitos clientes revelam o desejo de mostrar os coletores no projeto arquitetônico, outros, no entanto, preferem esconder. “Na sede central do CGD – Caixa Geral de Depósitos –, em Lisboa, uma construção de 100 mil m², onde trabalham cinco mil pessoas, conseguimos esconder os coletores nas faces internas do telhado voltadas para dois átrios descobertos”, relatou. Outro case é o da universidade UWC, em Cingapura, em que foram instalados 3,9 mil m² de painéis solares aparentes.
Segundo Holter, os sistemas de ar condicionado respondem pela maior fatia de consumo de energia elétrica nos segmentos de edifícios públicos e comerciais. “Para enfrentar esse que é um verdadeiro problema, cresce o uso da energia solar como fonte para o funcionamento dos condicionadores de ar”, disse.
Qualidade dos materiais
A qualidade dos SAS evolui junto com a dos materiais que compõem o produto. Julio César Di Cunto, da Aperam South America, mostrou alguns tipos de aço inoxidável, destacando o 444 que apresenta maior resistência à corrosão sob tensão se comparado ao 304, comumente utilizado. Fornecedora de isolamento térmico, a Saint Gobain/Isover, representada por Rodrigo Ratão, defendeu a lã de vidro como opção ideal por ser antifog, ou seja, impede a formação de condensação de materiais voláteis. Samuel Abrahão, da Cebrace, demonstrou que os vidros especiais com baixo teor de ferro para coletores propiciam uma abertura maior para a radiação solar, aumentando a eficiência do sistema.
Concessionárias e os SAS´s
Fernando Perrone, gerente do Departamento de Projetos de Eficiência Energética da da Eletrobrás, trouxe o histórico do PBE, desde 1994, os resultados do Procel no combate ao desperdício de energia e promoção da eficiência equivalente a 6,16 bilhões de kWh, resultado de várias frentes de trabalho, desde o desenvolvimento tecnológico e capacitação, até disseminação, marketing e regulamentação. Citou o histórico dos 10 anos da lei 10.295 sobre a Política Nacional de Conservação e Uso Racional de Energia, que incluiu a etiquetagem de edificações residenciais a partir de 2010, sendo que apenas neste um ano já contempla 54 prédios.
Alexandre Moana, da ABESCO – Associação Brasileira de Empresas de Conservação de Energia -, apresentou um resumo dos projetos com SAS e as vantagens quando associados à controladores eletrônicos. Esses sistemas permitem incrementos residuais de potência para que a água do banho atinja temperaturas de conforto e configuração de potência específica em dias e horários indicados, como tempo de banho e intervalo entre banhos – atributos que auxiliam na gestão da eficiência energética do sistema.
Fonte:http://www.dasolabrava.org.br/