O Brasil está a um passo de grandes mudanças no setor de energia elétrica. E não estamos falando do tema mais discutido em 2012, o reajuste das tarifas de energia com a renovação das concessões de empresas de geração e transmissão. Entrou em vigor no final do ano passado resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que facilita e estimula a geração descentralizada de energia no país. Com a medida, o consumidor já pode gerar energia solar em sua casa e obter descontos na conta de luz.
O potencial solar brasileiro é indiscutível. Dados do Atlas Solarimétrico, do Centro de Pesquisas de Eletricidade (Cepel), da Eletrobrás, mostram que o Brasil tem uma média anual de radiação global de até 2.300 kWh por metro quadrado. Se apenas 2% da área urbanizada fosse aproveitada para gerar eletricidade, toda a demanda brasileira poderia ser atendida. Estes números são significativos em tempos de preocupação com o baixo nível dos reservatórios das usinas hidrelétricas e o uso de 10,5 mil MW de térmicas abastecidas por combustíveis fósseis, mais poluentes, para evitar a ameaça de apagões.
Do ponto de vista econômico, a EPE (Empresa de Pesquisa Energética) atesta que a energia solar já é competitiva em diversas regiões do país — em função da incidência de sol e da tarifa praticada pela concessionária local. Com a tendência de queda no custo de geração, a viabilidade pode atingir até 98% das moradias do país.
A opção de investir em um sistema fotovoltaico de R$ 9 mil, que forneça 150 kWh por mês a uma casa, mostra-se potencialmente mais rentável do que aplicar o dinheiro na poupança. A energia gerada pelo sistema abateria um valor entre R$ 30 e R$ 70 por mês, enquanto o rendimento desse valor na poupança renderia R$ 45. Estes números mostram que já estava na hora de uma regulamentação específica para a microgeração, em particular a energia solar.
A resolução da Aneel é um avanço nesta direção. Editada em abril de 2012, ela estabelece condições gerais para o acesso de micro e minigeração distribuída em sistemas de energia renovável e cria um sistema de compensação de energia elétrica.
A geração distribuída de energia renovável, além de significar economia no bolso do consumidor, é uma revolução em relação à geração centralizada tradicional. Ela tem potencial de reduzir perdas nas redes — atualmente entre 10% e 12% —, economizar investimentos em transmissão — o Brasil deve gastar R$ 36 bilhões em linhas de transmissão nos próximos dez anos —, melhorar a qualidade do serviço de energia elétrica no país e ainda contribui para tornar mais limpa e diversificada a matriz energética brasileira.
A energia solar fotovoltaica será beneficiada pela resolução da Aneel, especialmente após uma série de reveses. Em 2002, a geração solar foi preterida do Programa de Incentivo a Fontes Alternativas de Energia (Proinfa) e, em 2009, paralisada na Câmara dos Deputados.
As concessionárias, que já tiveram 240 dias para se adaptar às novas regras, devem viabilizar a conexão de sistemas de microgeração de consumidores residenciais (ou de outros setores) em um prazo entre 80 a cem dias. Em países em que a geração solar fotovoltaica é difundida, como Alemanha, Espanha, Itália e EUA, o desenvolvimento do setor deveu-se a políticas de incentivo análogas as do Brasil.
Este é o primeiro passo de uma série de medidas que podem colocar a energia solar em destaque na matriz elétrica, a exemplo do que vem acontecendo com a energia eólica nos últimos anos. Entre os próximos passos importantes estão informar o consumidor de que gerar energia em casa já é possível e criar linhas de crédito para que estes equipamentos possam ser financiados. Da perspectiva do mercado, outros pontos cruciais são a preparação e capacitação da mão de obra para a instalação e manutenção desses sistemas.
Essa resolução, portanto, permitirá ao Brasil diversificar sua geração de eletricidade, que ainda está muito apoiada no binômio das energias hidrelétrica e termelétrica.
Fonte:http://oglobo.globo.com/amanha/energia-solar-vez-do-consumidor-7294371