Sob pressão da indústria, governo pretende incluir fotovoltaicas no PDE; alta tarifa, porém, ainda é questionada

Por Paulo Silva Junior, de Fortaleza (CE)- Na mesma fila onde acaba de passar a geração eólica, quem espera a vez é a indústria solar fotovoltaica. Do outro lado do balcão, o Ministério de Minas e Energia traça as semelhanças e diferenças entre os processos, trabalha num grupo dedicado a criar um plano para o segmento e ainda aguarda sinalizações mais concretas sobre a competitividade da fonte.

“O jeito que tratamos o tema já é bem diferente. Temos de sinalizar algo. O avião já decolou, e vamos construir as coisas já voando”, aponta o coordenador geral de fontes alterativas da área de planejamento do MME, Roberto Meira Junior, que participou do All About Energy em Fortaleza, Ceará, na última sexta-feira (08/07).

Até agora, a expansão da matriz brasileira nas atualizações do Plano Decenal de Energia (PDE) ainda não trouxe uma linha dedicada à energia solar fotovoltaica. Segundo Meira, porém, já é de conhecimento e consenso tanto no ministério quanto na Empresa de Pesquisa Energética (EPE) a necessidade de se traçar um roteiro dedicado exclusivamente à fonte. O especialista deixou em aberto, inclusive, a inclusão de dados já no PDE 2011-2020 -, desvinculando-a de outros tipos de geração alternativa. Um Grupo de Trabalho montado pelo MME tem até a metade de 2012 para apresentar o plano ao governo, incluindo uma solução para dúvidas ainda presentes na questão regulatória do uso e implantação da nova tecnologia.

O momento lembra, conforme debatido no evento no Nordeste, a mesma necessidade de definição pela qual passou o potencial eólico brasileiro há quatro, cinco anos atrás. “Antes, se você imagina uma reunião com 15 pessoas, eram 15 risadas quando se tocava no assunto. Hoje, pelo menos uns 12 levam a sério”, exemplifica Meira, numa das tantas metáforas usadas durante a explanação. Mas, apesar da dinâmica da fonte poder seguir a mesma rota da geração com a força dos ventos, o especialista explica algumas diferenças entre os cenários.

“Digamos que o caminho é o mesmo da eólica de alguns anos atrás, mas de jeitos diferentes. A eólica tinha a herança do Proinfa [Programa de Incentivo às Fontes Alternativas] e, em 2007, os empreendedores foram ao leilão em peso, para mostrar que tinham projetos para começar a gerar energia”. Na época, a EPE classificou a inscrição dizendo que “pela primeira vez, as eólicas apresentam interesse efetivo” em um certame.

“No solar, estão indo mais para a parte da cadeia industrial, que é também muito importante, mas ainda não há números, além de ainda precisarem buscar, de alguma forma, mais competitividade”, explica Meira.

Numa tabela de preço das tarifas apresentada na palestra, ficou clara a distância entre as fontes mais competitivas, encabeçada pelas hidrelétricas, e a solar fotovoltaica. Meira falou em geração a R$800 por MWh, ressaltando que o valor já está um pouco defasado, tamanha a velocidade com que tem caído. Especialistas já falam até em R$400 por MWh, e o representante do MME destacou que já há lugares no país onde os painéis seriam competitivos para a microgeração na rede.

Quanto à pressão por certames exclusivos para engatar a expansão da fonte, o coordenador foi cauteloso em relação ao cronograma a ser seguido. “O investidor quer leilão, quer documento, que saber quantos MW vão entrar por ano. Eles antes precisam mostrar competitividade, não dá para a gente abrir a contratação de energia e depois ver o que acontece”. A discussão passa principalmente pelos incentivos fiscais a serem oferecidos e pelo sistema de produção a ser adotado, com as importações necessárias, a nacionalização das tecnologias e o retorno ao consumidor. “Na Europa, soa como investimento, mas no Brasil querem ver o retorno de imediato”, finaliza.

Indústria

Na Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), 87 empresas se reúnem desde janeiro no Grupo Setorial de Sistemas Fotovoltaicos, comitê dividido em temas de interesse para o desenvolvimento do segmento.

Para o coordenador do grupo, Leônidas Andrade, a mobilização dos agentes do setor deixa claro que o chegou o momento de, enfim, uma legislação dar segurança para que as indústrias possam investir na produção de equipamentos. “Não podemos perder essa janela e só inserir a energia solar quando precisarmos de fato, porque pode ser tarde”, frisa.

O próprio Roberto Meira, do MME, se alinhou ao discurso do empresariado na intenção de que o Brasil precisa se tornar uma plataforma de exportação, seja para África ou para os vizinhos do Mercosul. De toda forma, o representante do governo ainda deixa em aberto as possibilidades a serem buscadas para o barateamento da tecnologia. “Eu, você e todos os brasileiros, que pagamos nossas contas de luz, já bastante altas, vamos achar legal pagar mais caro ainda para ter energia solar?” A reposta, o segmento espera ter em breve.

Exemplo europeu

O diretor-geral da espanhola Bonsol, Jerônimo Berocoechea, participou do encontro trazendo a experiência europeia na propagação da energia solar fotovoltaica. Para o executivo, o desenvolvimento precisa de uma regulamentação que garanta um período de estabilidade, mas com a ressalva de que incentivos não criem uma indústria “mal acostumada”.

“Na Alemanha, a venda de energia virou um ativo. O incentivo era regressivo, porque então você não mal cria a indústria, não a deixa protegida, e motiva um aumento de tecnologia ao mesmo tempo que dá aos investidores um período para calcular custos e amortizações. Na Espanha, deram prêmios muito altos, o que fez crescer muito de uma hora para outra por gente que nem era do setor de energia”, analisa o espanhol.

Berocoechea ressalta que a necessidade é de se buscar a competitividade com o aval do governo para um tempo de adaptação, sem que a fonte precise passar por competição logo de início. Por fim, disse também que o ideal seria que o setor conseguisse igualar o rendimento com outras fontes, mas que o custo, principalmente do silício, dificulta e muito tal objetivo.

Ainda falando em Europa, a energia proveniente dos raios solares foi a que mais cresceu no continente em 2010. Segundo a Associação Europeia da Industria Fotovoltaica (EPIA, na sigla em inglês), foram construídos parques que somam 13GW de potência instalada – aumento de 86%, que fez o continente chegar aos 28GW em usinas.

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