Será que as grandes cidades conseguem virar uma parte da solução ambiental, em vez de parte do problema?
Não se trata de uma pergunta à-tôa. Espera-se que a população urbana do mundo dispare nos próximos 20 anos, de mais de 3 bilhões atualmente para mais de 5 bilhões. Se a atual taxa de urbanização for mantida, as cidades vão responder por quase três quartos da demanda de combustíveis, inclusive para geração de energia, até 2030. A maior parte desse aumento virá de países em rápido desenvolvimento, como China e Índia; só as cidades da China terão de prover água, habitação, transporte e outros serviços para 400 milhões de novos habitantes urbanos até 2030.
Assim, não dá para as cidades só ficarem um pouco mais verdes; é preciso que elas sejam repensadas do começo ao fim. O objetivo: ambientes residenciais compactos que exijam menos recursos e extraiam o máximo da terra, água e energia que usam.
“Vai ter de haver novas formas de combustíveis, novas maneiras de distribuir energia e novas formas de infraestrutura”, diz Warren Karlenzig, presidente da consultoria Common Current, especializada em cidades sustentáveis. “Tudo isso vai ser necessário para que as cidades possam operar como operam hoje.”
Não faz muito tempo que a ideia de usar “verde” e “cidade” na mesma sentença parecia absurda. Cidades eram consideradas uma mancha no ambiente: chiqueiros de energia que vomitam poluição, verdadeiros infernos ambientais. Mas em anos recentes, elas começaram a ser vistas como modelos de virtude verde. Moradores de centros urbanos tendem a usar mais transporte coletivo, andar mais e dirigir menos do que os de pequenas cidades. Morar em apartamentos geralmente implica em menor uso de energia por residência.
A partir dessas vantagens, planejadores e construtoras estão criando soluções inovadoras para atender, agora e no futuro, às necessidades de energia, água, transporte e saneamento de habitantes urbanos.
Alguns melhoramentos são bem fáceis, como a mudança para a iluminação econômica com luminárias do tipo LED em prédios e postes de rua, ou a criação de faixas para bicicletas em ruas e avenidas e o alargamento de calçadas para estimular alternativas ao transporte automobilístico. Outras são mais ambiciosas e exigem novas obras ou até mesmo uma vasta reforma da infraestrutura urbana.
Alguns dos projetos mais ambiciosos — e as maiores fontes de ideias inovadoras — são as dezenas de projetos de “eco-cidades” que estão sendo desenvolvidas ou desenhadas em pranchetas pelo mundo afora. Projetos como o Distrito Comercial Internacional Songdo, perto de Incheon, na Coreia do Sul, estão na vanguarda, testando as últimas novidades em tecnologias verdes.
Mas as iniciativas verdes não são encontradas somente em projetos de novas cidades. A americana Chicago, por exemplo, tem cerca de 350 projetos de telhados ajardinados cobrindo mais de 400 mil metros quadrados.
É claro que muitas dessas iniciativas podem sair caro, com um custo inicial elevado. Planejadores urbanos dizem que a economia com as contas menores de eletricidade e outras coisas podem mais do que compensar as despesas extras, mas o ponto de equilíbrio pode levar anos para chegar. Mesmo assim, as cidades — diferentemente do proprietário da casa própria que pensa em instalar painéis de energia solar no teto — podem adotar uma visão de longo prazo e fazer investimentos que só terão retorno em décadas.
Assim, como poderiam as cidades — velhas e novas — levar o verde a um novo patamar? Eis algumas maneiras:
Microturbinas Eólicas As enormes fazendas de vento que já são vistas em alguns cenários rurais não servem para as cidades, onde a vibração poderia chacoalhar as janelas e o barulho seria irritante.
Por isso os planejadores estão se voltando para microturbinas. Esses pequenos geradores ficam em cima de prédios comerciais ou residenciais e são projetados para aproveitarem as características típicas do vento nas grandes cidades — muita turbulência e mudanças frequentes e repentinas de direção.
Essas turbinas são geralmente pequenas, com poder de 1 a 3 quilowatts cada. Mas quando instaladas em série e combinadas com painéis de energia solar de alta eficiência, conseguem gerar uma grande parte da quantidade de eletricidade que um prédio necessita, especialmente quando a estrutura é equipada com um conjunto completo de recursos para economizar luz.
Um pequeno grupo de empresas fornece microssistemas eólicos pelo mundo, e os aparelhos, embora mais caros por quilowatt do que sistemas maiores, foram já instalados em vários lugares, entre os quais a sede administrativa da PepsiCo Inc. em Chicago.
Armazenamento Hídrico Bombeado/Micro-hidrelétricas As energias eólica e solar são notoriamente inconstantes, produzindo mais eletricidade do que é preciso em certos momentos e menos do que é desejado em outros. Uma cidade que quer contar com essas fontes intermitentes precisa descobrir uma maneira de acumular essa energia.
Uma técnica: o armazenamento hídrico bombeado. Quando a energia eólica ou solar é abundante, a eletricidade é usada para bombear água para um reservatório superior; mais tarde, quando a eletricidade é requerida, a água é liberada para descer, alimentando turbinas no processo. (Os lagos resultantes têm a vantagem adicional de ajudar no paisagismo dos espaços externos do prédio.)
Sistema de armazenagem hídrica de grande escala estão sendo cada vez mais usados para guardar energia, e muitas cidades isoladas dependem de micro-hidrelétricas para ter eletricidade.
Acrescentar uma instalação de armazenamento hidrelétrico não é tecnicamente difícil, mas é caro, especialmente em pequena escala, e a atual tecnologia geralmente exige uma grande “queda”, ou mudança de elevação, para produzir eletricidade em quantidade — mas as empresas estão desenvolvendo turbinas hidráulicas de baixo fluxo que consigam operar em ambientes com menos inclinação.
Andar a pé e de bicicleta Ao reunir pessoas, empregos e serviços em alta concentração, as metrópoles têm o potencial de estimular o uso de transporte coletivo. Embora isso seja mais factível em centros urbanos do mundo desenvolvido, metrópoles não tão ricas também têm tentado ampliar suas alternativas de serviços de ônibus e outros transportes públicos.
Os planejadores de cidades “verdes” avançam ainda mais, projetando ruas de maneira que caminhar seja seguro, conveniente e interessante, com amplas calçadas, paisagismo e muitas faixas de pedestres, além de designar faixas exclusivas para bicicletas nas ruas, além de ciclovias dedicadas.
Songdo, na Coreia, com seus 607 hectares, foi projetada de modo que a maioria das lojas, parques e pontos de ônibus possa ser alcançada em uma caminhada de menos de 15 minutos. A cidade também tem uma rede de 24 quilômetros de ciclovias.
Algumas cidades também estão experimentando o PRT, sigla em inglês para Transporte Pessoal Rápido. São véiculos que trafegam por vias específicas e podem carregar até seis pessoas cada. Não há horários ou rotas fixas, cada passageiro escolhe aonde quer ir e um computador central guia o carro sem paradas intermediárias.
Coleta de Lixo Pneumática Até mesmo as cidades mais verdes produzem montanhas de lixo, o que cria dois problemas: coletar o lixo e eliminá-lo.
Do lado da coleta de resíduos, um sistema centralizado, utilizando uma rede subterrânea de tubos pneumáticos, pode substituir as frotas de caminhões que atrapalham o trânsito, estragam a pavimentação das ruas e queimam combustíveis fósseis.
Os tubos podem recolher o lixo tanto das casas como dos latões de lixo nas ruas e levá-lo a um centro de coleta e triagem. Embora alguns sistemas recolham apenas resíduos de alimentos, outros são planejados para tratar da coleta separada de papel e outros resíduos recicláveis.
Esses sistemas são utilizados atualmente em dezenas de cidades em todo o mundo; um sistema pneumático de coleta de lixo na Ilha Roosevelt, em Nova York, está em operação desde 1975.
Transformar lixo em recursos Alcançar desperdício zero é tão importante para as cidades como alcançar o carbono zero.
Isto significa não só incentivar os moradores a reciclar. As cidades também podem implantar tecnologias que aproveitam a energia e outros recursos valiosos enterrados no lixo.
Avançados digestores anaeróbicos processam o lixo orgânico e o lodo que sobra do tratamento de águas residuais para a produção de biogás, que pode ser queimado para gerar energia. Essa tecnologia, mais comum na Europa, está começando a ser implantada nos EUA para o tratamento do lixo urbano.
Gaseificadoras por arco de plasma de alta temperatura podem consumir quase todo o fluxo de resíduos, gerando um gás sintético que é queimado para produzir eletricidade. A escória que sobra pode ser usada em materiais de construção.
Em um novo sistema em estudos no projeto PlanIT Valley, uma cidade ecológica planejada para o norte de Portugal, as latas de alumínio são processadas com água e energia, produzindo óxido de alumínio e hidrogênio, que pode então ser usado para alimentar células a combustível.
Mas como o óxido de alumínio exige tremendas quantidades de energia para fabricar alumínio, pode ser mais viável economicamente apenas reciclar as embalagens de alumínio.
Telhados verdes Os telhados, que ocupam um quinto da superfície urbana, podem ser usados para instalar painéis solares ou turbinas eólicas; mas sem ser isso, são subutilizados.
Cobrir o alto dos edifícios com gramíneas, arbustos e outras plantas pode gerar uma série de benefícios.
Embora com frequência seja mais caro do que as coberturas tradicionais, o telhado verde proporciona isolamento e reduz as necessidades de aquecimento e resfriamento de um edifício.
Ele absorve a água da chuva, reduzindo a carga dos sistemas de drenagem de águas pluviais, e filtra o restante da água que escorre, podendo assim ser usado para muitas necessidades domésticas. Esse telhado também filtra muitos poluentes do ar.
Fonte:http://online.wsj.com